sexta-feira, janeiro 18

gazela da morte obscura

Quero dormir o sono das maçãs, 

fugir do tumulto que há nos cemitérios. 

Quero dormir o sono do menino 

que queria cortar seu coração no alto - mar. 


Não quero que me repitam que os mortos não perdem o sangue; 

que a boca impaciente continua a pedir água. 

Não quero inteirar-me dos martírios que a erva nos dá, 

nem da lua com boca de serpente 

que trabalha antes do amanhecer. 


Quero dormir um pouco, 

um pouco, um minuto, um século; 

mas saibam todos que ainda não morri; 

que em meus lábios há um estábulo de ouro; 

que sou o querido amigo do vento Oeste; 

que sou a sombra imensa das minhas lágrimas. 


Cobre-me com um véu ao amanhecer, 

pois vai atirar-me mãos cheias de formigas, 

e com água dura molhar meus sapatos 

para mais deslizar o ferrão do seu lacrau.

 

Porque quero dormir o sono das maçãs 

para aprender um pranto que me limpe de terra; 

porque quero viver com o menino obscuro 

que queria cortar seu coração no alto - mar. 


Federico Garcia Lorca

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