domingo, setembro 14

no centenário

NA MANHÃ SEGUINTE CESARE PAVESE 

NÃO PEDIU O PEQUENO ALMOÇO


Logo que desceu do comboio,

só, atravessou a cidade deserta,

entrou sozinho no desocupado hotel,

franqueou a porta do quarto individual,

e escutou com assombro o silêncio.

Dizem que levantou o auscultador

para chamar a alguém

nas é falso, completamente falso.

Como se houvesse alguém a quem chamar -

ninguém vivia na cidade, ninguém no mundo.

ingeriu a água, as pequenas drageias,

e esperou a chegada do sono.

Com um certo receio pela sua saúde -

tinha pela primeira vez firmado a sua existência -,

talvez curioso, com amolecidos gestos,

sentiu chegar o peso das pálpebras.

Horas depois - um enigmático sorriso

desenhava-lhe os lábios -

a si mesmo anunciou, convictamente,

a única certeza que no fim tinha adquirido:

jamais voltaria a dormir só num quarto de hotel.


Juan Luís Panero



1 comentário:

Anónimo disse...

Não conhecia. Este trecho é fabuloso!
Obrigada por partilhares.