terça-feira, março 4

de seda...

Meu Senhor Amado não tenhas medo, não te mexas, fica em silêncio, ninguém nos verá.

Fica assim, quero olhar para ti, olhei-te muito mas não eras para mim, agora és para mim, não te aproximes, por favor, fica como estás, temos uma noite  para nós e eu quero olhar para ti, nunca te vi assim, o teu corpo para mim, a tua pele, fecha os olhos, e acaricia-te, por favor, não abras  os olhos se puderes, e acaricia-te, são tão bonitas as tuas mãos, sonhei com elas tantas vezes, agora quero vê-las, gosto de as ver na tua pele, assim, por favor, continua, não abras os olhos, eu estou aqui, ninguem nos pode ver e eu estou ao pé de ti, acaricia-te meu senhor amado, acaricia o teu sexo, peço-te, devagar, é bonita a tua mão no teu sexo, não pares, eu gosto de olhar para ele e de olhar para ti meu senhor amado, não abras os olhos, ainda não, não tenhas medo, estou perto de ti, sentes-me? Estou aqui, posso aflorar-te, isto é seda, sentes?, é a seda do meu vestido, não abras os olhos e terás a minha pele, terás os meus lábios, quando te tocar pela primeira vez será com os meus lábios, tu não saberás onde, a determinada altura sentirás o calor dos meus lábios, sobre ti, não podes saber onde se não abrires os olhos, não os abras, sentirás a minha boca onde não sabes, de repente, talvez seja nos teus olhos, apoiarei a minha boca nas palpebras e nas pestanas, sentirás o calor entrar na tua cabeça, e os meus lábios nos teus olhos, dentro, ou talvez seja no teu sexo, apoiarei os meus lábios, lá em baixo, e descerrá-los-ei descendo pouco a pouco, deixarei que o teu sexo entreabra a minha boca, entrando entre os meus lábios e empurrando a minha língua, a minha saliva descerá ao longo da tua pele até á tua mão, o meu beijo e a tua mão, um dentro do outro, no teu sexo, até que finalmente te beijarei no coração, porque te quero, morderei a pele que bate no teu coração, porque te quero,e com o coração entre os meus lábios tu serás meu, de verdade, com a minha boca no coração tu serás meu, para sempre, se não acreditas em mim abre os olhos meu senhor amado e olha para mim, sou eu, quem poderá alguma vez apagar este instante que acontece, e este meu corpo sem mais seda, nas tuas mãos que lhe tocam, os teus olhos que olham para ele, os teus dedos no meu sexo, a tua língua nos meus lábios, tu a deslizar debaixo de mim, pegas nas minhas ancas, levantas-me, deixas-me deslizar sobre o teu sexo, devagar, quem poderá apagar isto, tu dentro de mim mexendo-te devagar, as tuas mãos no meu rosto, os dedos na minha boca, o prazer nos teus olhos, a tua voz, mexes-te devagar mas até me magoar, o meu prazer, a minha voz, o meu corpo sobre o teu, as tuas costas a levantarem-me, os teu braços a segurarem-me, os golpes dentro de mim,é violência doce, vejo os teu olhos procurarem nos meus, querem saber até onde me podem magoar, até onde quiseres, meu senhor amado, não há fim, não acabará, vês? Ninguém poderá apagar este instante que acontece, para sempre atirarás a cabeça para trás, gritando, para sempre fecharei os olhos arrancando as lágrimas das minhas pestanas, a minha voz dentro da tua, a tua violência a manter-me agarrada já não há tempo para fugir nem força para resistir, tinha que ser este instante, e este instante é, acredita em mim, meu senhor amado, este instante será, de agora em diante, será, até ao fim.-Não nos voltaremos a ver, Senhor.

-Aquilo que era para nós, fizemo-lo, e vós sabeis. Acreditai em mim: fizemo-lo para sempre. Protegei a vossa vida de mim.

E não hesitai um instante, se for util para vossa felicidade, em esquecer esta mulher que agora vos diz, sem lamentar, adeus.

Carta que a mulher escreve ao marido numa história de amor que não é aquilo que parece.

Seda, inicialmente editado pela Difel, volta agora aos escaparates pela mão da Dom Quixote. Há uns anos atrás quando li o primeiro livro de Barrico "Novecentos" comprei todos seus livros entre os quais este, que não li. Sei agora, que a capa era feia e que não chamava a atenção.
Sei também agora, que durante uns anos não conheci este conto maravilhoso que parece um sonho e que nos envolve como um manto de seda. Leve, leve...

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